Olimpíadas do Dinheiro
Criei essa série com um simples motivo: explicar macroeconomia pro povão com aquele papo reto e direto que eu sempre mando aqui no blog MundoRaiam.
Por que isso? Por que eu tô vendo que nego tá dando muita importância para a porra da Olimpíada.
O que tua vida vai mudar se o Diego Hypólito ganhar a medalha de ouro?
Como eu falei no artigo de introdução da série Olimpíadas do Dinheiro, já estive dos dois lados da moeda e posso dizer que ESPORTE SÓ É BOM PRA QUEM JOGA!
Enquanto a mídia fala daquele atleta russo que é favorito a ganhar a medalha de ouro nas barras paralelas assimétricas, por que não ir contra a maré e falar como a produção de gás natural da Rússia afeta nós aqui no Brasil.
A ideia da série Olimpíadas do Dinheiro é exatamente essa. Toda terça e sábado vai ter um país diferente.
O de hoje é o México!
Capítulo 2: A Economia do México
Escolhi a Índia para estrear a série por um simples motivo: eu morei lá.
O México é o segundo por um motivo bem parecido. A verdade é que eu tenho um carinho especial pelo México e conto muito mais sobre isso no meu novo livro Imigrante Ilegal (lançamento marcado para setembro 2016).
Nunca morei no México mas passei minha adolescência quase que inteira a 15 minutos da fronteira entre San Diego e Tijuana.
Depois de 8 anos longe, minha primeira business trip dentro do mercado financeiro foi para um Investor Day bi-nacional de uma empresa da bolsa mexicana chamada Grupo Aeroportuario del Pacífico (GAP).
Disse bi-nacional porque metade da conferência era num resort na ilha de Coronado (San Diego) e a outra metade era dentro do aeroporto de Tijuana do lado de lá da fronteira.
Essa visita era interessante porque o aeroporto que a GAP estava construindo tinha a pista de pouso do lado mexicano do muro e o terminal do lado americano.
Coisa de louco mesmo… depois dá uma olhada aqui nesse vídeo para ver como a parada funciona.
Falei um pouco sobre minha experiência lá em Tijuana na introdução daquele post sobre a palestra do megainvestidor Luis Stuhlberger.
Chega de cerimônia. Vamos ao que interessa: como é que o México ganha o dinheirinho dele?
Pagar imposto ninguém quer, né?
No post inaugural da série Olimpíada do Dinheiro sobre a Índia, eu falei um pouco sobre o problema de arrecadação de impostos que o governo indiano tá tendo que batalhar.
O México tem um problema bem parecido: a economia é essencialmente informal.
Como é que você mede o grau de informalidade de um país?
Pega a receita de impostos e divide pelo PIB.
Entre os 34 países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico, o México está na última posição com apenas 19%.
O que isso quer dizer? Que nego lá no México adora fazer as coisas debaixo do pano… sem imposto mesmo.
Papo reto: 26% do PIB do México e 60% dos trabalhadores ativos vêm dessa “economia informal” dos pequenos negócios. Depois dá uma olhada nesse artigo aqui da TeleSur.
A culpa não é só do trabalhador informal não.
O sistema de impostos lá no México é tão complicado mas tão complicado… que é mais fácil não pagar imposto e lidar com as (mini)consequências depois.
Desigualdade social na fronteira
Vou te falar que o México é tão fudido quanto a gente quando assunto é desigualdade de renda.
Eu tive a oportunidade de viver dois lados dessa desigualdade social que toma conta do México… e tudo num período de menos de um ano.
No Ensino Médio em San Diego, eu dividia a sala de aula com imigrantes recém-chegados de Sinaloa.
Era uma galera que nem falava espanhol direito (quiçá o inglês) e havia acabado de cruzar a fronteira com suas famílias.
Já que as escolas de ensino médio na Califórnia não pedem papelada nem visto de estudante na hora da matrícula, qualquer um pode chegar lá e estudar.
Eu mesmo me aproveitei desse loophole na lei americana e terminei o Ensino Médio em San Diego meio que na gambiarra imigratória: esse é o tema principal do meu livro Imigrante Ilegal.
Com 17, eu saí da Califórnia e fui morar na Pennsylvania para estudar numa universidade de bacana.
Lá em Penn, eu estudava com os herdeiros das principais famílias do México.
Era gente que nasceu e cresceu dentro México… mas tinha cara de americano, sobrenome de europeu e algumas centenas de milhões de dólares de patrimônio na família.
A minha conclusão depois de viver os dois mundos do México dentro dos Estados Unidos foi a seguinte: a grande maioria da galera que se arrisca no deserto pra cruzar a fronteira é gente que tem zero oportunidade dentro do México.
Gente de classe baixa baixa mesmo… muitos deles de áreas rurais do país.
A classe média do México julga imigração como algo de gente inferior… gente sem perspectiva nenhuma.
Agora pergunta se uma mãe do Leblon ou do Jardim Paulista deixaria seu filho contratar um coiote em Tijuana e imigrar sozinho para os Estados Unidos pelo deserto? Nem a pau.
A mãe de classe média da Cidade do México pensa mais ou menos assim.
Slimlandia
O mexicano Carlos Slim é o cara mais rico do mundo. Parabéns pra ele!
Ele é dono de quê?
Praticamente tudo!
Papo reto: a holding dele é acionista-controlador de 222 empresas… fora as centenas de outras empresas que ele entrou como investidor minoritário.
Se você passar um dia na Cidade do México, boto 99% de chances de você botar uma grana no bolso do Slim sem perceber.
Os mexicanos nascem nos hospitais do Slim, bebem Coca Cola das fábricas do Slim, dirigem em estradas com pavimento do Slim, fumam cigarros do Slim, constroem casas com o cimento do Slim, jantam em restaurantes do Slim, pegam mensalidade do telefone pro Slim e transam em cima dos lençóis fabricados pelo Slim… e o produto dessa transa volta para o mesmo ciclo: nascem nos hospitais do Slim, fumam cigarros do Slim, etc etc etc.
Pega o índice IPC (bolsa de valores mexicanas) e você vai ver que 40% das empresas tem dedo do cara.
Isso é bom ou é ruim?
Tô longe de ser comunista e não quero tirar os méritos do cara.
Mas vou te mandar a real: essa concentração de poder acaba fudendo o país PORQUE GERA UM MONTE DE MONOPÓLIOS!
Mano, as 16 famílias mais ricas do México controlam 11% do PIB do país!
Tem noção do que é isso?
Sem competição, quem se dá bem é o Slim (e essa outra galera com sobrenomes gringos).
Sem competição, a desigualdade que eu apresentei no item anterior só se perpetua.
Para você ter uma ideia, o salário-mínimo do mexicano em 1976 conseguia comprar 4x do que o salário mínimo do mexicano de 2016.
Por que isso?
Simples: a renda dele estagnou por causa do efeito da inflação. Enquanto isso, o custo de vida dele subiu porque ele não tem muita opção de comprar as coisas fora do monopólio.
Aí volta para aquela famosa golden rule:
“He who has the gold makes the rule”
O bagulho é louco, nego!
Todos os ovos numa cesta só
Pega as estatísticas de exportação do México e você vai ter um troço.
80% das exportações do país vão para um destino só: os Estados Unidos.
É exatamente por isso que tem aquela célebre frase no mercado financeiro:
“If the American economy catches a cold, Mexico catches pneumonia”
Só com esse número de exportações aí em cima, dá para concluir que um resfriadinho nos Estados Unidos gera uma pneumonia fudida lá no México.
Mano, pra você ter uma ideia, o PIB do México caiu 6% só com a crise de subprime americana de 2008.
Nós aqui no Brasil estamos passando por uma crise fudida… e o PIB tá caindo 1%-2%.
Vai vendo.
A verdade é que um país precisa do outro… não dá pra negar.
O jogo meio que mudou esse ano por causa de um cara maluco chamado Donald Trump.
Trump simplesmente saiu atacando o México de todas as maneiras possíveis, dizendo que o México é um país de drogados, estupradores e ladrões de empregos.
E o pior é que ele tá trazendo uma galera forte junto com ele e a treta entre os dois países só tá aumentando… e essa porra pode piorar ainda mais se o maluco ganhar a eleição no fim do ano.
Falando nisso, recomendo o livro Adios, America: The Left’s Plan to Turn Our Country Into a Third World Hellhole de uma mulher chamada Ann Coulter.
Ann Coulter é uma versão feminina do Donald Trump e passa o livro inteiro metendo o pau no México e nos imigrantes mexicanos.
O livro é tão extremista, tão agressivo que eu colocaria na estante de livros de comédia.
Tá valendo a pena para rir um pouco.
Economia de Western Union
Hoje em dia, eu viajo para a Califórnia pelo menos duas vezes por ano e freqüento muito bairros latinos como Barrio Logan e Golden Hill (San Diego) e Jefferson Park e East LA (Los Angeles).
Uma coisa que você vai notar nesses bairros latinos dos Estados Unidos é que tem uma birosca em cada esquina.
Além de produtos típicos de mercearia com inscrições em espanhol, toda birosca de bairro tem uma plaquinha escrito “Western Union” perto do caixa.
Por que diabos eu chamei essa seção de “Economia de Western Union”?
Segura essa estatística aqui então:
Em 2015, México gerou mais dinheiro em transferências eletrônicas do que em royalties de petróleo.
E olha que o México é o 6o. maior produtor de petróleo do mundo.
Se você acha que isso é balela sensacionalista do Raiam, vai direto pra fonte no site do NBC News.
Foram apenas 24.8 bilhões de dólares numa conta que os economistas americanos chamam de “remittances”.
Já caiu a ficha por que esse número de remittances é tão grande?
Sim senhor!
Os imigrantes mexicanos nos Estados Unidos têm laços muito fortes com suas respectivas famílias lá no México.
Eles cruzam a fronteira e passam a ganhar muito dinheiro para os padrões mexicanos.
O que eles fazem?
Pegam um pouquinho daquilo, vão na birosca da esquina e enviam lá para a vovó lá nos cafundós de Michoacán.
Na real, mesmo se os caras ganharem salário mínimo limpando vaso sanitário na Califórnia, aqueles 1800 dólares valem dinheiro pra cacete se converter pra peso!
Já vi esse filme
Pensa numa companhia estatal que bombeia petróleo no meio do mar.
Essa companhia é bem ineficiente e os empregados são bem improdutivos.
Na real, a maioria dos empregados no payroll dessa companhia nem trabalha.
Essa companhia gera muito dinheiro em forma de impostos e royalties para o governo.
Essa companhia já foi um orgulho nacional por décadas mas hoje está praticamente quebrada e sem perspectiva nenhuma para futuro.
É claro que estou falando da Petrobrás, né?!
E se eu te falar que eu estava descrevendo a situação da PEMEX, estatal mexicana do petróleo?
Falei ali em cima que o mexicano não tá acostumado a pagar impostos né?
Como é que o governo não quebrou ainda?
Porque 1/3 da receita tributária do governo vinha dessa máquina de fazer dinheiro chamada PEMEX.
Só que deu ruim, né?
E o efeito foi oposto ao da Índia: o preço do petróleo caiu e a PEMEX se fudeu!
O pior de tudo é que o petróleo é propriedade do governo mexicano. Com isso, a PEMEX tem uma dificuldade enorme para levantar grana de investidor para financiar seus projetos.
Esse problema de capital chega a ser pior que na Petrobrás, viu?
Além de sofrer com todos os problemas do mercado macro e também todos aqueles problemas internos estilo-Petrobrás, a PEMEX apanha também do roubo de petróleo.
Só em 2014, foram 1.3 bilhões de dólares perdidos só com roubo (insightcrime.org).
Tá ligado quando tu vai numa favela aqui no Brasil e você vê um monte de gambiarra de fios nos postes de eletricidade?
Lá no México, eles fazem gatos nos dutos de petróleo!
O roubo de óleo em território mexicano subiu 52% ano-a-ano e parece que o negócio não vai virar tão cedo porque quem manda são os cartéis… e eles mesmos estão por trás dessas gambiarras.
A Indústria das Drogas
Escrever um post sobre a economia do México e não falar de cocaína é igual levar aquela gata no motel e ficar só nas preliminares.
Não preciso nem dizer que os dólares do narcotráfico têm uma participação bem significante na economia do México.
Só que essa grana não é diretamente contabilizada no PIB por razões bem óbvias.
A verdade é que o negócio tá fedendo cada vez mais por lá.
Para você ter uma ideia, a taxa de homicídios do México subiu 7.5% de 2014 para 2015.
Cara, 7.5% é coisa pra caramba!
Aonde está concentrada a grande parte dessa violência executada por parte dos cartéis mexicanos?
Em estados como Chihuahua, Coahuila, Tamaulipas e Nuevo León … os mesmos estados que abrigam grande parte do pulmão industrial do país.
Aí fudeu, né?
Lembra nas aulas de geografia da 7a série que a gente aprendeu sobre as indústrias maquiladoras que ficavam no lado mexicano da fronteira para produzir bens de consumo para os americanos a um preço muito mais baixo?
Como é que os caras vão atrair cérebros de tecnologia e bons engenheiros para tocar montadoras de automóveis e linhas de produção de eletroeletrônicos numa das áreas mais perigosas do mundo?
Para piorar, não é incomum escutar notícias de grandes empresas gringas sendo extorquidas pelos cartéis ali no norte do México. Dá uma olhada nesse artigo do Business Insider depois.
Se essa parada de violência de cartéis continuar por ali, daqui a pouco o México vai perder uma de suas principais fontes de grana.
Leitura recomendada
Gostou do meu resumão informal e quer se aprofundar no assunto México? Segue aí a lista de leitura:
Breakout Nations: In Pursuit of the Next Economic Miracles – Ruchir Sharma
The Growth Map – Jim O’Neill
Adios, America: The Left’s Plan to Turn Our Country Into a Third World Hellhole – Ann Coulter
No One Is Illegal: Fighting Racism and State Violence in the US-Mexico Border – Justin Akers Chacon
Livro Wall Street
Bom, como muitos de vocês sabem, passei dois anos da minha vida trabalhando na bolsa de valores de Nova York.
Dos 21 aos 23 anos, eu participei daquele oba-oba todo do boom das commodities, do Eike Batista e do real super-valorizado.
Para você ter uma ideia, eu ganhava uns 30-40mil reais por mês só pra fazer planilhas de Excel e enfeitar apresentações no PowerPoint.
Quer saber mais detalhes do que realmente rola dentro de um banco de investimento, sem censuras?
Leia meu novo livro Wall Street!
Ele está disponível em formato e-book no Amazon e em formato audiobook no Ubook.
Próximo Capítulo

O próximo país a ser “analisado” na série Olimpíadas do Dinheiro vai ser a Indonésia.
Terça-feira eu tô de volta!
Abraço
~Raiam
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